"Quem acredita sempre alcança, nunca deixe que digam que não vale a pena acreditar nos sonhos que se tem ou que seus planos nunca vão dar certo, ou que você nunca vai ser alguém."

sábado, 27 de setembro de 2014

Coqueluche: revisão atual de uma antiga doença


     A coqueluche é uma doença infecciosa causada pela Bordetella pertussis, e em casos raros pela Bordetella parapertussis. A Bordetella é um bacilo aeróbico gramnegativo, pleomórfico1. Após a década de 40, com o advento da vacinação (difteria, tétano e pertussis - DTP), o número de casos caiu drasticamente, porém aumento de casos são identificados a cada 2-3 anos.1 A doença ocorre em todo o mundo, aparentemente sem padrão sazonal.                  Alguns autores sugerem uma maior ocorrência no verão e outono. O número de casos vem aumentando de forma assustadora nos últimos 2 anos no Rio Grande do Sul (RS), no Brasil e no mundo. Cada vez mais deve-se buscar o diagnóstico precoce, o controle de contactantes com profilaxia e a vacinação das populações atualmente não vacinadas ou pouco vacinadas (adolescentes, adultos e gestantes).

A definição de caso segue os critérios a seguir:

Tosse por pelo menos 2 semanas e:
– paroxismos; ou
– guincho inspiratório com vômitos após, sem causa
aparente.

Critério laboratorial:

– Bordetella pertussis isolada em espécime clínica; ou
– reação de cadeia da polimerase positiva para B. pertussis.

Quadro clínico

A coqueluche tem duração de aproximadamente 6 a 12 semanas, e apresenta três estágios clínicos:

– Fase catarral, com duração de 7 a 14 dias: cursa com rinorreia, lacrimejamento, febre baixa, e no final desta fase inicia a tosse seca.

- Fase paroxística, com duração de 1 a 4 semanas: cursa com 5-10 episódios de tosse durante uma expiração, guincho na inspiração forçada, vômitos pós-tosse, paroxismos em torno de 30 episódios a cada 24 h (espontâneos ou por estímulo). Durante o paroxismo pode ocorrer cianose, olhos salientes, salivação, lacrimejamento e distensão das veias do pescoço. Normalmente a criança fica assintomática entre os episódios de tosse.

– Fase de convalescença, com duração de 1 a 2 semanas: cursa com diminuição da frequência e gravidade da tosse. Neste período o epitélio do paciente fica susceptível e pode ocorrer paroxismos novamente se o paciente apresentar uma infecção respiratória concomitante. É importante lembrar que lactentes menores de 6 meses podem apresentar uma clínica atípica, sem guincho. Muitas vezes apenas apresentando uma fase catarral mais curta, paroxismos sem guincho, cianose e ou apneia. Os pacientes maiores de 10 anos também apresentam uma clínica não tão intensa com paroxismos sem guincho. A vacinação prévia também pode atenuar o quadro clínico.

     As complicações em adultos e adolescentes são incomuns, mas incluem desde síncope e distúrbios do sono até fratura de costela. Lactentes podem apresentar quadros mais graves com pneumonia (22%), convulsões (2%) e encefalopatia (< 0,5%). Óbitos são raros e afetam principalmente menores de 6 meses. Pacientes no pós-coqueluche podem reapresentar tosse paroxística mesmo após estarem assintomáticos, caso apresentem uma nova infecção na via área (exemplo: Influenza), em virtude das alterações que persistem no epitélio do trato respiratório nos meses que seguem à coqueluche.

Diagnóstico laboratorial

     A cultura é um método de alta especificidade, porém vários fatores interferem na sua sensibilidade. Seu uso tem grande importância epidemiológica para a vigilância da sensibilidade da bactéria aos macrolídeos. A Tabela 1 mostra as características dos métodos disponíveis para o diagnóstico laboratorial da coqueluche. O meio mais fácil e sensível para o diagnóstico é através da PCR da secreção respiratória, mas a cultura também pode ser utilizada, porém esta pode ter sua sensibilidade
diminuída caso o paciente já esteja em uso de antimicrobianos ou em pacientes vacinados. A sorologia só tem benefício em pacientes vacinados há mais de 2 anos, e deve ser colhida em duas etapas, sendo a primeira amostra preferencialmente colhida na fase catarral. Com relação à PCR é importante ressaltar que ela detecta bactérias mortas e vivas. Podemos estar apenas diante de detecção de uma bactéria morta que causou infecção há algumas semanas. Por isso o teste deve ser
indicado somente quando a sintomatologia é condizente com coqueluche.

Tratamento

     É importante ressaltar que a evolução da doença só é modificada pelo antimicrobiano se iniciado na fase catarral. Quando iniciado tardiamente o antibiótico só evita que o paciente siga transmitindo a doença. Com relação aos macrolídeos, a resistência é rara, não devendo nos dias de hoje ser ainda motivo de preocupação. Pacientes menores de 6 meses que utilizaram macrolídeo no tratamento devem ser observados durante 30 dias, pelo risco de desenvolver estenose hipertrófica de piloro. O tratamento da tosse com outros medicamentos (corticoides, salbutamol) não se mostrou eficaz,

Prevenção, isolamento, quimioprofilaxia

     A transmissão ocorre através de gotículas produzidas durante o acesso de tosse, atingindo a via área do contactante susceptível. O paciente deve ficar afastado da escola ou do trabalho durante pelo menos cinco dias do início dos antibióticos. Na hospitalização, o mesmo período deve ser observado. A coqueluche tem uma taxa de ataque que varia de 70-100%, assemelhando-se a doenças de alta contagiosidade, como a varicela. Nem a infecção, nem a imunização conferem imunidade duradoura, portanto mesmo os pacientes com coqueluche devem revisar sua carteira de vacinação.
     A quimioprofilaxia, que é feita com os mesmos medicamentos e pelo mesmo tempo que o tratamento, deve ser indicada conforme abaixo:

– Independentemente da vacinação, mas até 21 dias do início da tosse no caso index: Para todos contactantes domiciliares, e contactantes próximos (creches).
– Após 21 dias do início da tosse no caso index somente nos de alto risco: Lactentes, gestantes, contactantes de lactentes.

Com relação à vacinação, as crianças devem receber a vacina DTP de células inteiras da pertussis ou DTPa com componente pertussis acelular aos 2, 4, 6 meses; primeiro reforço com 15 meses, e segundo reforço com 4-6 anos. É recomendado que o reforço entre 10 e 14 anos seja feito com a tríplice bacteriana acelular do tipo adulto (dTpa), e não apenas com a forma dupla (difteria e tétano). Outras estratégias visam diminuir a circulação da Bordetella entre os adultos, como a vacinação dos profissionais da saúde, a vacinação das gestantes (após 20 semanas), e a vacinação dos adultos (pais, avós, irmãos, babás, etc.), que irão ter contato com crianças menores de 1 ano (estratégia cocoon/casulo). A coqueluche é uma doença de notificação compulsória, e sempre que o médico suspeitar do diagnóstico deve comunicar a Vigilância do município.

FONTE: Motta F & Cunha J. Coqueluche: revisão atual de uma antiga doença. Boletim Científico de Pediatria - Vol. 1, N° 2, 2012

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